O RIACHO/AÇUDE DO JOÃO GOMES

Pe. José Neto de França

Conheci o riacho do João Gomes ainda criança, por ocasião das minhas idas aos sítios Serrote dos Franças e Serrote dos Bois, onde residiam meus avós e tios paternos e maternos, além de outros familiares.

Nos arquivos de minha memória, já amareladas pela linha do tempo, estão as imagens de quando o “João Gomes, alimentado pelas águas de outros pequenos riachos ao longo de seu leito e de outras águas vindas das encostas em alguns pontos de seu espaço geográfico, por ocasião dos invernos mais intensos, desciam, hora turvas e “avassaladoras”, hora serenas e cristalinas. Quantas vezes em épocas de cheia, literalmente tremendo de medo, o atravessei sendo carregado nos ombros de meu pai!

O ponto onde fazia a travessia, a pé enxuto ou não, via-o como enigmático. Os outros pontos, no sentido de quem vai para os Serrotes dos Franças e dos Bois, eram: as “Tocalhas”, onde fica uma pequena capela num ponto no qual dizia-se que foi fruto de uma emboscada num passado distante, esta antes do João Gomes; a casa do seu Benedito Clemente (in memoriam), um senhor que sempre deixava um “purrão” – pequeno pote – cheio de água doce e um caneco para os transeuntes que passassem por ali saciar a sede, esse logo após o riacho; a casa de umas irmã de papai, tia Marina (in memoriam) e tio Pedro Maciel (in memoriam), seis quilômetros após o João Gomes, ponto esse que seria ó último antes do Serrote dos Bois; e o Povoado Olho d’Água do Amaro, se a direção fosse no sentido do Serrote dos Franças.

De todos esses pontos (uma das minhas características é marcar pontos significativos entre trajetos) o mais enigmático era justamente o riacho João Gomes. Tanto nas minhas idas, quanto nos meus retornos, ficava apreensivo até minha chegada e passagem por ele, estivesse ele com água ou seco.

Mesmo com toda tensão que ficava, pegava minha peteca (estilingue) e ficava atento. Como se ela fosse me defender de alguma coisa, embora no universo de meu pensar da época eu acreditava que sim. Rsssss...

Até minha adolescência, nunca andei sozinho por aquelas “bandas”, devido ao meu medo do sobrenatural, mas isso já é outra história!

No geral, cheio ou seco, gostava de contemplá-lo. Ambos, ele e eu nos fustigávamos! Aliás, até hoje, já que ele está impregnado no meu existir.

Eis que passados muitos anos, um prefeito, mais precisamente, Isnaldo Bulhões (in memoriam) conseguiu recursos federais para represá-lo nesse ponto enigmático e transformá-lo num imenso açude – “mar” – aproveitando o espaço geográfico favorável e, assim, beneficiar a população “ribeirinha”. Infelizmente esse amigo foi uma das vítimas fatais da COVID-19 e não viu sua conclusão. Sua filha, que o sucedeu, na administração municipal, foi quem concretizou esse sonho que não foi somente dele, mas de todos.

Ao acompanhar a sua construção eu ficava a imaginar quantos invernos não seriam necessários para encher essa barragem.

Mas, como o pensamento humano é um e o divino é outro, eis que só precisou de um. Esse ano de 2022 as chuvas foram tão intensas que a barragem está com um “espelho d’água” de imponência, fantástica!

Enigmas da vida!!!

[Pe. José Neto de França]

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