GUERRA E PAZ

Djalma Carvalho

Para começarmos a andar, basta-nos o primeiro passo.
Tudo começou quando li o livro Graciliano Ramos em Palmeira dos Índios (Imprensa Oficial, Maceió, 2013), de autoria de Valdemar de Souza Lima (1902-1987), detendo-me, particularmente, no registro encontrado nas páginas 150/151. Passo importante, sem dúvida.
Mestre Graça, enquanto viveu em Palmeira dos Índios, uma de suas preferências para leitura era, por exemplo, Leon Tolstói (1828-1910), clássico da literatura russa. “Lia, de contínuo, Guerra e Paz e recomendava a obra aos companheiros, seguindo idêntico expediente com relação à Bíblia que também sempre gostou de compulsar. Porém nunca chegou a travar relações estreitas com São Marcos e seus confrades”, assinalou Valdemar de Souza Lima, que fora vizinho de Graciliano em Palmeira dos Índios e o conhecera pessoalmente.
Valdemar de Souza Lima era considerado santanense porque residira e trabalhara em Santana do Ipanema, desde muito jovem, no período de 1917 a 1930, tendo sido empregado da firma de Dona Sinhá Rodrigues, viúva do coronel Manoel Rodrigues da Rocha. Era filho de Josefa Leite de Souza Lima, antiga professora que educou gerações de santanenses. Há uma rua na cidade com o nome da ilustre mestra. Ainda, como intelectual, escritor, cronista e memorialista, Valdemar de Souza Lima é patrono da Cadeira nº 7 da Academia Santanense de Letras, Ciências e Artes.
A partir desses registros, somente fui encontrar Guerra e Paz (Editora Cosac Naify, São Paulo, 2013), obra-prima de Tolstói, clássico da literatura russa e universal, em livraria no centro do Recife. Assustei-me com os dois volumosos exemplares, cada um com 1230 páginas, não computadas as páginas da lista de personagens, fatos históricos e notas sobre o autor, inseridas ao final de cada volume.
Que trabalho me deu o primeiro volume, engalfinhado que estive com o livro e com sua leitura – cansativa, mas fascinante – durante a pandemia, de fevereiro passado até hoje!
Nos intervalos, compulsava outros livros, em leitura transversal, tendo chegado, modéstia à parte, à marca de 23 exemplares até agora. Graças a Deus, esse desempenho deveu-se ao meu confinamento compulsório em casa, obedecendo a protocolos do isolamento social, apavorado com o crescente e chocante número de vítimas fatais da Covid-19. Também, porque, assim, encontrei meios para administrar a ociosidade, prazerosamente lendo e escrevendo.
Acumulei, nesse período, sessenta crônicas escritas, prontas para novo livro, algumas publicadas no portal Maltanet, além do penoso trabalho de preparo da 2ª edição de Festas de Santana, já entregue à editora.
Encantou-me, inicialmente, a brilhante apresentação de Guerra e Paz, a cargo de Rubens Figueiredo, tradutor da obra, romancista, duas vezes ganhador do Prêmio Jabuti de Literatura e graduado em português-russo pela Faculdade de Letras da UFRJ.
O livro foi escrito entre 1863 e 1869, quando Tolsltói tinha a idade de 35 anos. Disse o apresentador e tradutor: “Seu plano inicial era um romance sobre os chamados decembristas, grupo de oficiais e nobres revolucionários, influenciados pelo iluminismo francês, que em dezembro de 1825 desencadearam um movimento contra o tsar Nicolau I.”
Assim, além do romance, o livro mostra a história da Rússia aristocrática dos primórdios do século XVIII, época das guerras napoleônicas, sobretudo no período de 1805 a 1812. Na Batalha de Austerlitz, em 2 dezembro de 1805, por exemplo, Napoleão derrotou o exército russo. O gênio militar e a ambição dominadora de Napoleão Bonaparte continuaram a submeter Prússia, Polônia e Áustria, indo até Roma em 1809 para aprisionar o papa Pio VII, levando-o para Savona, na França. Finalmente, em 24 de outubro de 1812, na Batalha de Malo Iaroslávets, os russos derrotaram as tropas de Napoleão.
Todo o enredo do livro, notavelmente articulado, terá sido ambientado em Moscou, Petersburgo e arredores desses históricos centros urbanos de então. Ressalta Tolstói o envolvimento político e social de famílias detentoras de grandes propriedades, os senhores de terras, de luxuosas e amplas casas de campo, de mesas de refeição de muitos lugares. Essa aristocracia de privilégios detinha as terras da Rússia e possuía muitos escravos, chamados servos. Embora tivesse havido o fim da escravidão em 1861, boa parte dos servos passou a viver, ainda, sob o regime feudal.
Os personagens do romance pertencem, em sua maioria, à sociedade russa, aristocrática, recheada de nobres, de príncipes, princesas, condes e condessas, beldades, refinadas damas, cortesões, generais, ministros e embaixadores. Costumeiramente, casarões e palácios acolhiam essas ilustres figuras em festas e bailes de luxo e opulência. Gente da aristocracia com privilégios perpetuados que o próprio imperador Nicolau I combatia, desde 1825.
A paisagem construída por Tolstói é de impressionante beleza poética, cristalina, a par da dinâmica dos personagens em cenas e diálogos literalmente bem produzidos, em meio a tramas, enredo, emoção, paixão, amor, traições e ciúme. De encontros e desencontros, o amor do príncipe Andrei pela lindíssima jovem Natacha prende o leitor do início ao final do primeiro volume do livro.
A genialidade de Leon Tolstói levar-nos-á a conhecer, presumivelmente, ao final da leitura do segundo volume, o destino desse belíssimo romance, do apaixonado casal, protagonista, Andrei e Natacha.
Veremos.

Maceió, fevereiro de 2021.

Comentários