A CONFISSÃO DE MADALENA

Antonio Machado

Depois de perder os pais, Madalena passou a viver sozinha, numa casa velha feita de taipa, coberta de telha com chão batido, era um piso desigual entre um buraco e uma barroca. A vida passava sem pressa para aquela velha solteirona dentro de seus quarenta e oito quilômetros rodados na estrada da vida, onde os lampejos da mocidade não encontrava mais guarida.

Na sua mocidade teve um "pacuteio"(namoro) com o coronel Juventino, porém esses afagos foram poucos, visto o coronel já ter perdido os fulgores da juventude, não sendo homem mais para mulher como dizia sua esposa Biomercina. Mas desses poucos encontros,o coronel lhe dera umas magras tarefas de terra pendentes do tanque velho. A diversão de Madalena era o pagode,o reisado e a novena de dona Cocó, que embevecia os presentes, que só voltavam pra casa após a subida do balão que depois, lá nas alturas parecia uma pequena bola de fogo perdida no espaço, em busca da serra do Pedrão, parecendo levar consigo em seu bojo as lembranças e esperanças daquela gente,ao som da zabumba de Rozendo Baldo.

Sendo Madalena devota de Padim Ciço, sempre ia ao Juazeiro em carro pau de arara, foi quando por caiporismo, mandou fazer por Maria Preta do gameleiro, uma calçola, tendo comprado um metro de chitão a dona Dagmar, e mandou colocar um bolso por dentro com um fechicler, para guardar o dinheiro, previnindo-se dos ladrões que eventualmente aparecessem. Aconteceu,porém, que a tranca do fechicler começou a arranhar o "passarinho" incomodando muito a romeira Madalena a viagem foi longa, mas finalmente chegou ao seu final. Já em casa,Madalena tirou a calçola e doou ao meu padinho e nunca mais vestiu tal veste.

Tempos depois, comprou outra peça na feira da sulanca, deu uma coceira que inchou o passarinho todo tendo ela se vendo aperreada foi ter com dr Brito, não surtindo muito efeito consultou o garrafeiro primo Tônico, que lhe receitou uma purga, a exemplo de pião preto pega-pinto, safroa, gergilim, miras-sol, milho roxo torrado, imburana de cheiro e quina-quina só usando essas sementes, e ainda lhe prescrevo uma dieta de carne de porco, ovo de galinha pedrez fato de porco, capote macho, carne de veado e farinha de mandioca catirina, e que ela enterrasse a calçola no formigueiro, durante sete semanas não passasse naquele lugar.

A essa altura disse Madalena: Mestre primo, o passarinho tá na carne viva só não lhe mostro porque o senhor é homem, o velho mesinheiro ouviu a conversa e engoliu a resposta. O remédio foi tiro e queda, quinze dias depois Madalena estava curada da silva porém, a abstinência de determinados elementos, ela manteve até o fim da vida por serem muito carregados.

Em conversa com as amigas, Madalena se dizia não poder usar tal instrumento e achava até que era pecado, desejaria muito se confessar com o padre e contar-lhe sua história. Tudo tem seu dia, e numa visita a cidade, encontrou o padre Janildo Medeiros e lhe pediu confissão o reverendo aceitou atendê-la. Então Madalena revelou ao sacerdote toda a sua história carregada de pecados, pacientemente, o velho levita riu em determinados momentos do relato no confessionário e por fim, isto lhe disse: Minha senhora isto não é pecado, levou uma vida reta, nem tanto seu vigário na minha mocidade ,na fulô dos anos,a ndei dando uns tombos, mas foi por pouco tempo e com a velhice o velho Juventino perdeu a coragem só levantava o pé do chão, pegou até um esporão brabo e mal podia andar ,e minha vizinha Sinhá Ana, dizia que quem não tem munição não atira então o que o senhor me diz? Hora Madalena, retrucou o padre, pecado velho morre antes do dono, a senhora está absolvida, amém e encerrou a confissão deixando Madalena feliz da vida. E em casa, com as amigas ela comentou me confessei com o padre santo ainda novo com o cheiro da fulô dos anos mas muito bom e piedoso, porém vesti calçola, nunca mais, por fim eu disse a ele, olhe padre já tive o passarinho na carne viva, hoje ele tá velho de cabeça branca, mais jamais ninguém viu ou botou a mão em riba, e ao senhor Deus lhe pague.

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