José Antonino Cabral Serafim, conhecido popularmente em fins dos anos 30 , como “Zé Ventulino”, alcunha atribuída ao referido, desde sua infância, devido a uma “protuberância mórbida nasal”. Este sujeito, além de narigudo era um legítimo macilento (magro e alto) e com fama de finório(esperto).
No largo da camuxinga, havia uma quase inexistência de residências, era naqueles confins que morava o dito cujo, juntamente com sua mulher, dona Virtuosa e seus três filhos Geraldo, Germinio e Gerencio. Conta os mais velhos que Zé Ventulino, já beirando os 50 anos, resolve ir a uma “casa de recurso” (cabaré), localizada no bairro do momunento, cuja historiografia santanense era de propriedade de um cidadão chamado Olegário. Zé Ventulino era negociante de gado e tinha um terreno lá pras banda da “Usina” (Hoje Senador Rui Palmeira), portanto, andava sempre com dinheiro no bolso e vestido de acordo com a moda da época. Dona Virtuosa nem desconfiava dessa astúcia de seu mancebo, pois Zé era um homem caseiro e tinha certo receio, pois seu sogro era capador de bode e segundo as más línguas era coiteiro de cangaceiro, um homem labrego(grosseiro), que morava no Povoado Chicão (Hoje Ouro Branco) e se chamava Napoleão. Chegando lá, no ambiente fescenino(obsceno), após o fim da feira de gado e ao cair da tarde, encontrava-se um ajudante de bar e duas “mulheres-dama”(quengas), já que as demais foram “dar feira” em Palmeira dos Índios. Zé desceu de seu potro e se dirigiu pela primeira vez aquele lugar de luxúria e pediu logo, uma “talagada” de “Zinebra gato”, a aguardente da época. O Bicho já era feio e fazendo careta, parecia o cão chupando manga. Sem mais delongas, pediu outra dose, dessa feita, além da careta deu um “engulho”. Terminada as preliminares etílicas, Zé chama o ajudante do recinto e indaga:
- Meu fí, quando é que paga pra “frever” ?
- e essas mulé-dama tão disocupada?
Zé como no início de sua biografia, eu afirmei que ele tinha a fama de esperto, más, diante daquelas circunstâncias, o home tava mais por fora do que cinturão de veio. O ajudante era um rapaz de seus 18 anos, filho de uma “quenga-véia” de Rio Largo e prontamente indagou o postulante a orgia:
- Agente já vamo fechar! agora só amanhã! e seu Olegaro num ta qui pra receber o dinheiro.
Zé já tonto, devido as talagadas tomadas e também não era acostumado a beber, esperneou:
- Comé ? você num tem medo de morrer não? Sabe quem sou eu?
- Sei não sinhô ?
- Sou da pulíça militá, sou sordado do Coronel Lucena. Vai dispachar ou não ? ou qué que eu feche esse furdunço ?
- Sim sinhô, o sinhô num paga nada não, pode iscoiê uma das duas mulé.
- Zé já ariado grita:
- agora eu me arretei ! eu vou ficar cum as duas !
Zé desemboca para um dos “quartinhos” com as “unheiras”(quengas) e começa o labafero. Zé já fora do ar, já bebe a cachaça na boca do litro e ligeirinho tava mais bebum do que “banda mel” em jogo do Botafogo.
Não se sabe de Zé, se ele conseguiu fazer alguma coisa, o fato é que vai dando seis horas da tarde e como a porta do prostíbulo estava aberta, entra dois soldados do 2º Batalhão da Polícia Militar (funcionava onde era o Ginásio Santana) e logo em seguida atrás, o Coronel Lucena. O ajudante fica tremendo mais que vara verde e isso chama a atenção da autoridade maior:
- Que foi cabra ? nunca viu home não ?
- Desculpe Doutor Coronel
- Doutor o quê cabra ! você ta vendo algum médico aqui ? E por quê ta tremendo ? Tá devendo ?
- Não sinhô !
- Por acaso passou por aqui um cabra com dois cavalos ? E de quem é esse cavalo que estar na porta ?
O Coronel Lucena, estava apurando uma denúncia, onde se tratava de um ladrão de cavalo (era comum na época) que agia de vez quando na feira de gado da cidade.
- Não sinhô, aqui só ta eu, e lá no quartinho, um soldado do sinhô com duas mulé ?
- Soldado meu ! eu não dou folga a soldado meu dia de feira !
- O coronel toma a seguinte atitude:
- Toinho, vai mais Ciço olhar que tem tá no quarto! Se fizer pantim, atire!
Chegando ao local de prazer, estava Zé em decúbito(deitado), bêbado, todo vomitado e as coitadas das quengas, chorando e Zé com uma “sete polegada”(faca-peixeira) que brilhava mais que catarro em parede e não conseguia nem ficar sentado na cama e ameaçando as bichinhas. Um dos soldados, o Toinho, conheceu Zé Ventulino e gritou:
- Coronel, Coronel, vem aqui!
O coronel chega ao local e o soldado dar a ficha de Zé:
- Coronel, esse cabra eu conheço é Zé Ventulino, metido a sabido, foi ele quem vendeu aquele jumento cego ao senhor.
O Coronel Lucena não ouve nem o resto da conversa e parte pra cima de Zé.
- Cabra safado ! côrno ! filho de uma égua, além de ladrão é metido a soldado ! vai apanhar de bunda limpa, cachorro !
Zé entrou em desespero total:
- Num faça uma mizera dessa comigo não, coronel ! pelo amor de Deus, eu sou pai de família, tenho uma mulé e três fío pra criar, num me dismoralize não seu Coronel é a primeira vez que eu venho aqui ! eu juro pro sinhô que o sinhô nunca mais vai me vê por aqui pro riba !
O Coronel sentiu pena do famigerado e perguntou ao soldado Toinho:
- Toinho, tu conhece esse cabra mesmo ? ele tem mulher e filhos ?
- É ele mesmo coronel é o Zé Ventulino, olhe o tamanho da venta dele ! Ele mora na camuxinga ! a mulher dele é direita e é de bem, Vive de casa pra missa e o povo diz até que ela dá nele !
O Coronel Lucena dar uma risada, mais acredita na história do soldado Toinho e toma uma decisão inédita para a época:
Ciço, pegue os cavalos, bote esse safado em cima e nós vamos entregar ele a mulher dele, lá ela resolve.
Zé entra em mais desespero ainda:
- Não seu Coronel, num vá me levá não !
- O coronel responde:
- Quer ir pra casa ou começar apanhar daqui e ir apanhando pelo meio da rua até chegar ao batalhão e dormir lá, seu safado?
Zé se conforma, sobe no cavalo e resolve ir pra casa mais a tropa. A diligência, junto com Zé e antes de chegar em casa já se ver um alvoroço, onde os poucos vizinhos consolam Dona Virtuosa, onde chorosa, já não sabia mais o que fazer, pois Zé nunca chegava de noite em casa. Vendo Zé no cavalo, seus filhos correm a gritam:
- Pai chegou ! Pai Chegou !
- O coronel toma a frente da caravana e indaga Dona Virtuosa:
- A senhora é mulher desse traste?
- Som sim sinhô, seu coronel e o que foi que ele fez ?
- Tava no Cabaré de Olegário, com duas mulé, bebum que só um gambá e ainda dizendo que era soldado de polícia.
- Mais Zé, num faça uma mizera dessa, eu num disse a você que assim que terminasse a feira, viesse pra casa. Além de tá fazendo baderna nos canto, tava com “malassado de cangote” (quenga, unheira, puta, rapariga). Pois agora você vai me pagar. Prontamente Dona Virtuosa pega um “currião” e “lasca” no lombo do aventureiro do amor. Aquela cena de violência torna-se jocosa diante dos espectadores. Zé no meio da “sova” corre pra dentro de casa. Dona Virtuosa agradece ao Coronel Lucena e promete a ele que Zé não vai mais dar trabalho.
Para encurtar a história, o Coronel volta pro quartel com os soldados. Zé, apanhado, desmoralizado, ressacado, acorda no outro dia, mais latanhado do que Juda de semana santa, resolve partir pra cima de Dona Virtuosa:
- Você acabou comigo, sujeita amarela ! Vô le lascar agora !
- Quando Zé levanta a mão para dar uma bordoada na esposa, antes de atingi-la, quem segura na mão dele é seu sogro, o senhor Napoleão, que acabara de chegar de viagem:
- Você vai bater em quem, cabra de pêia ?
Nisso entra pela porta dos fundos dois cangaceiros (tudo indica que eram do bando do subgrupo do Cangaceiro Zé sereno, cujos apelidos não foram revelados pela testemunha). Não se sabe o que aconteceu com Zé Ventulino nesse dia. A verdade é que Zé recebeu uma graça e não perdia mais uma missa, nem procissão e volta e meia estava nos pés do Padre Bulhões. Enquanto vida teve, nunca mais freqüentou uma “casa de recurso”.
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