MANÉ BUCHUDO

Crônicas

José Peixoto Noya

Baixinho. Barriga proeminente nem precisa registrar, pois a alcunha já o fez. Hoje é funcionário aposentado do DNER, atual DNIT. Quando ali cheguei para trabalhar já o encontrei com muitos anos de serviço. Era meio devagar em tudo, igualzinho ao Dorival Caimmy. Com ele não existia pressa. Porém, era cumpridor dos seus deveres como funcionário público.

Não foram do meu tempo, naquela repartição, nem esta história nem o Engenheiro Chefe da Residência 20/2 de então, o Dr. Almir Reis. Este era calmo algumas vezes e noutras, a maioria delas, gostava de implicar com seus subordinados, creio que confiante nos seus quase dois metros de altura.

Certo dia ele resolveu fazer uma inspeção nos trabalhos de campo, e encontrou nosso personagem, no horário do almoço, com uma faquinha “trabalhando” num pedaço de madeira, deitado sob uma das caçambas existentes naquele acampamento para funcionários.

Como já citei anteriormente, Dr. Almir era calmo, mas gostava de “encrencar” com os subordinados. Foi logo perguntando a Mané se ele não tinha o que fazer àquela hora? Com a rapidez de um bicho preguiça, respondeu e nem se deu ao luxo de levantar os olhos:

- Dr. Almir, estamos no horário de descanso, e eu estou aproveitando para fazer uma paparrapapá.
Pense no caboclo abusado que ficou o Engenheiro!
- Como é a história, “Seu” Mané?
- É isto mesmo, doutor! Eu estou fazendo uma paparrapapá!
Pronto! Aí foi que o homem ficou furioso, pensando que o dito cujo estava gozando com a sua cara.

Mané, eu vou fazer novamente a pergunta. O que é que o senhor está fazendo com esta faca e esta madeira em suas mãos? – disse já tremendo de raiva e mais abusado ainda.

Mané não se intimidou e continuou com o seu trabalho, respondendo mais uma vez com a calma que Deus lhe deu:

Dr. Almir, eu estou fazendo uma paparrapapá!

Piorou tudo! O fazedor de estradas federais ficou tiririca!

Mané não estava nem aí. Com a cabeça baixa continuou o seu trabalho. É bom frisar que Mané Buchudo era um exímio escultor. Era o nosso Vitalino, só que em madeira. O que o Mestre Vitalino fazia em barro lá em Caruaru, Mané fazia em madeira, e era bem feito. Era um artista de “mão cheia”, sem nenhuma pretensão profissional nem alguém que o incentivasse ou que viesse a descobri-lo para o mundo artístico. E fazia suas esculturas simples com a maior criatividade.

Mas, a verdade daquele momento era outra. A ameaça se chamava Dr. Almir, invocado, abusado e nervoso, fazendo as mesmas perguntas, e obtendo a mesma resposta: “Doutor, eu estou fazendo uma paparrapapá!” E ponto final. Depois de uma peleja sem fim. Dr. Almir, de um lado, abusado e nervoso e, do outro, Mané Buchudo calmo feito Dorival Caimmy.

Finalmente Dr. Almir baixou o tom de voz, e Mané mais calmo ainda, continuava:

Dr. Almir eu estou fazendo uma paparrapapá!

Vamos traduzir logo isto, se não esta história não termina mais. Mané queria dizer o seguinte: “Dr. Almir, eu estou fazendo uma pá pra raspar a pá!” Como era um dia de chuva e o material (barro) estava molhado, este grudava na pá de metal. Aquele invento iria ajudar a retirar o barro que ficasse preso na pá propriamente dita. Facilitaria o seu trabalho e de seus colegas “cassacos”, como éramos chamados naquela época.

Dr. Almir, não podendo recriminar, saiu de fininho, até esboçando um sorriso bastante amarelo. De certa forma, também estava satisfeito pela criatividade, paciência e dedicação do Mané ao trabalho. Mané Buchudo, com a mesma paciência, continuou a fazer o seu engenhoso invento, querendo terminar logo a sua paparrapapá.

Comentários