Verdades Fatuais

Adriano Nunes



Ao contrário de verdades científicas e filosóficas, que podem ser testadas a qualquer instante e serem alteradas, paradigmaticamente, as verdades fatuais são o que são. Só monstros procuram alterá-las para atender as suas nefastas ideologias.

Vale aqui lembrar o que tanto nos alertava Hannah Arendt: "na medida em que a verdade fatual se expõe à hostilidade dos defensores de opiniões, ela é pelo menos tão vulnerável como a verdade filosófica racional". A vulnerabilidade das verdades fatuais ocorre justamente porque elas não existem para agradar ninguém. Elas apenas existem e são o que são, ainda que com elas não se concorde, ou pior: que não as aceitemos!

Por isso não há mais como negar que nazismo e fascismo foram movimentos abjetos de direita bem como o comunismo cruel soviético era de esquerda. A questão maior não reside se são de esquerda ou de direita. A questão racional é que são os três condenados pela razão. E as suas manifestações atuais em redor do mundo devem ser plenamente coibidas, porque podem engendrar horrores piores.

Mas como convencer racionalmente cidadãos/cidadãs de que essas ideologias são perigosas se a priori muitas pessoas parecem negar as verdades fatuais de onde elas têm raízes históricas? Não é uma simples aplicação de um "conceito" historicamente determinado a um movimento contemporâneo. Tentar invalidar essa preocupação com questões humanitárias soa sub-repticiamente desonesto. Como convencer racionalmente aqueles de que a terra não é plana, se em sua fé irremovível até o paraíso existe com seres metafísicos, como promessa certa e inescapável? Quando se tenta anular verdades fatuais, corre-se o risco de mergulhar num abismo escuro cujo fundo tende a fundamentalismos arbitrários e intolerantes.

Como convencer racionalmente que a escravidão ocorreu e que ainda hoje são evidenciados discursos e práticas que a legitimam se há pessoas instruídas que ironizam e relativizam quaisquer formas de discriminação, de preconceito e racismos? É preciso muita coragem para encarar a realidade fatual.

Ainda com Hannah, podemos ver, com certa esperança, que "a persuasão e a violência podem destruir a verdade, mas não substituí-la". Sim, a razão estará sempre pronta e disposta a apontar distorções e contradições.

Adriano Nunes

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