Outro dia, em visita de trabalho a lugarejo alagoano, deparei-me com cena que parecia sacada de um quadro de realismo cruel.
À minha frente, imensa poça de lama se espalhava pelo chão e dentro dela, meia dúzia de porcos movimentavam-se à vontade, revolvendo a sujeira e espalhando respingos ao redor, como se aquele fosse seu fétido habitat natural.
Como cheguei antes do combinado, sentei em tamborete da única bodega do arruado e enquanto provava o guaraná “Jesus”, acompanhava o noticiário em TV que recebia imagens via parabólica.
O repórter falava sobre mais um escândalo gerado por desvio de verbas originalmente destinadas a saúde da população, seguindo roteiro bem conhecido: recursos públicos que deveriam financiar hospitais, remédios, equipamentos e atendimentos médicos, subtraídos para contas pessoais no exterior, com a intermediação de doleiros especializados na arte da dissimulação financeira.
Ainda degustando meu refrigerante “cor rosa, sabor cravo e canela”, mirei novamente a alegria dos suínos, que apesar de grudentos se sentiam absolutos, e alheios ao desconforto que causavam ao redor, lambuzados de lixo com prazer genuíno, indiferentes ao cheiro que se espalhava, a imundície que escorria e a irritação dos que vivem nas redondezas. Para eles, o local representava conforto e bem-estar; para os outros, incômodo e desordem.
Pensei que os leitões chafurdam na lama movidos pelo instinto, sem qualquer preocupação com a imundície que espalhavam. Para eles, o molhado era frescor e luxo, sem culpa ou intenção.
Já os indivíduos que se escondem por detrás das sombrias cortinas do poder e desviam dinheiro, fazem o mesmo, mas com proposito mais perverso, pois se locupletam de privilégios, mergulham em artimanhas e engessam gerações inteiras para manter seu próprio banquete.
Estou certo de que a diferença entre ambos, está na consciência do ato. O primeiro irracional, age por impulso e desconhece o impacto de sua pilhagem. O segundo, por sua vez, astuto, calculista e plenamente sabedor do estrago que provoca, teima em continuar a espalhar sua sujeira, não por ignorância, mas por conveniência.
Se o porco se banha no lodo para refrescar-se, o ser pensante se reveste dele para perpetuar sua influência. Dois animais, um inocente e o outro mestre na arte da degradação.
O INOCENTE E O MESTRE NA ARTE DA DEGRADAÇÃO
CrônicasPor Alberto Rostand Lanverly Presidente da Academia Alagoana de Letras 26/05/2025 - 07h 48min

Comentários