OFICINA DE CRÔNICA

Crônicas

Por Marcello Ricardo Almeida

Aos devotados a Cronos, hoje, inauguro a Oficina de Crônica. Na primeira seção, ei-lo verbo, e este se faz crônica. O que é crônica, de que se faz, em que se divide e do que se alimenta? Meras narrativas literárias ou especulações em jornal (em plataformas digitais).

Inaugurada a Oficina de Crônica. E, cada dia existe e resiste, dia após dia, não por causa da crônica, graças a esta capacidade do povo em alimentar mitologias. E na rua onde moro há exemplo.

Diegese é a realidade ficcionalizada na criação narrativa; e um texto transmite a sua mensagem com a qual se comunica; na oração há a presença do verbo na unidade sintática com ajuda do predicado; a cada palavra formam-se frases. No dizer de narrações autodiegéticas, move-se o mundo pela potência das imagens e a crônica faz-se com 1001 noites.

Crônica casa com cronista feito o texto fruto de observações
E, assim, textualiza-se; tão textualmente vivos,
Cronificando realidades qual louco fingimento,
A realidade que escapa por dedos que de fato é crônica viva.

Uma parente daquela Autopsicografia fingida e fugidia,
Crônica (as e os que as escrevem não diferem das/dos que leem),
Não exatamente nesta ordem ou desordem e, assim, transbordam
Seguindo segundo a cultura ora de quem as escreve.

E, por fim, nas linhas, nos nós e por entre breves parágrafos moles,
As ideias, as inferências e tão fugazes fruições,
Neste parque de diversões, míticas e temporais
Seguem carrosséis a festa que se faz pedindo mais diversões. Mas:

O que move o mundo? As significações. Na segunda seção: Estratégia do universo. De que universo se fala? Do universo do cronista que cronifica a sua casa. Aqui, o público alvo convive com a linguagem, com o objetivo para delimitar os dados fugazes da realidade. Sabe-se: cronista é poeta que escreve prosa.

E os eixos de aprendizagem, processos criativos, mediação, intervenção sociocultural? Deixe tudo à crônica, a crônica possui um estômago do tamanho do mundo. A crônica como gênero cujo texto é coletado sempre da realidade e esta é analisada jornalística ou literariamente por cronistas.

Crônica e conto têm diferenças sutis. Falta à crônica enredo e conflito.
Por que se diz crônica? Não sabe que é pela devoção ao tempo, chronica a Khrónos devotada. Dela é o tacho onde giram os ventos e fazem derramar as nuvens. Na oficina, você sequer imagina o interesse; isto sem falar na frequência dos alunos, nas perguntas, nos diálogos, nas mensagens.
Gênero crônica, às vezes com o olhar de Betty representada por Lauren em “Uma Aventura na Martinica”, e outros veem Feathers por Angie em “Onde Começa o Inferno”, as peripécias de Arlequina por Margot. Crônica desde os tempos dos folhetinistas. Nela um quê de Capitu provocando ciúmes a Bentinho, ou Gabriela no telhado ao lhe escalar Sônia; Rosa, por Yoná em “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, talvez o cronista celebrado contista, poeta que se notabiliza com “O Corvo”, que trata do feminicídio com mote à morte de uma amante, nas palavras de Edgar, “despojado de seu amor.”

Ávida vida é transportada no carro das ciências imaginárias e a leitura o contrato de adesão estabelecido entre quem escreve e quem lê. Na terceira seção, na oficina, ouve-se com frequência falar que o futebol é invenção inglesa e a crônica uma invenção francesa; e, na quitanda, aqui perto de casa, ninguém acredita não ter sido a crônica literária invenção carioca. A tal quitanda lembra aquele comércio no início do século passado onde Don Corleone é baleado ao comprar laranjas.

Na quarta aula, a semana vai alta, as características ao gosto da midiosfera na comunicação impressa em papel ou publicada nesta territorialidade virtual. Textos, palavras, ei-las orações em parágrafos – sobre situações comuns – nas criações em cujos elementos (tempo e espaço) transitam personagens onde vive e revive o gênero textual narrativo transfigurando fatos, crônica a observar os acontecimentos “invisíveis” a maioria do povo. Há fato e este, aparentemente banal, transmuda-se na crônica sobre o cotidiano.

Cabe à crônica coerência, coesão (estratégia da textualidade). É a crônica dando sentido à realidade, gênero coerente por natureza em sua recriação. Crônica é coesa ao se transfigurar no fato do qual se alimenta usando as veredas gramaticais. Crônica faz-se crônica ao ser de trânsito fácil na mobilidade urbana.

Crônica diz por escrito o que se diz no bate-papo do dia a dia. E o que fala a crônica amplia-se de sentidos e objetividades, mesmo quando é lida carregada de dizeres que lhe ressignificam.

E, nesta primeira semana, a oficina de crônica consolida-se. A oficina estável igual a quitanda próxima à casa onde moro. Ela torna-se alimento desde à matrícula, fortalecendo as fruições e inferências como se imagina o sentido dos afetos nas relações humanizatórias.
Com a metodologia dialética na oficina, onde uma opinião ouve uma segunda opinião e chega-se à terceira, o conhecimento prévio é discutido dialogicamente. Diálogo prevalece na oficina. Este é o seu desfecho apoiado na reescrita e sumarização (resume-se e constrói-se mentalmente o texto) e se estabelece expectativas em múltiplos universos temáticos.

Na segunda semana, alunos usando os seus próprios recursos expressam-se cronificando múltiplos universos temáticos. Até alguns em textos multissemióticos que navegam nas ondas da concordância nominal e verbal. Nas unidades de sentido, as naus em mares nunca antes guiadas por normas gráficas em sintonia com o gênero textual narrativo; agora, releem, revisam crônicas produzidas, com interação do professor.
Ao cabo de um mês, o aluno é capaz de escrever uma crônica por si, sem o nível de desenvolvimento potencial. Em um mês, na oficina de crônica, o aluno encontra-se no nível de desenvolvimento real porque a escreve sozinho. O nível de desenvolvimento proximal distancia-se do aluno a cada seção.

Relendo e revisando a própria crônica, o aluno não depende mais do nível de desenvolvimento potencial, pois consegue escrever a crônica sem ajuda do professor. Com domínio, ele desenvolve as competências e habilidades, domina os conhecimentos necessários ao pleno desenvolvimento das competências mobilizando diferentes habilidades. Por si mesmo faz cortes, faz acréscimos, reformulações, pontuação, correções de ortografia, dá função social à crônica.

Na oficina de crônica, o aluno faz o caminho ao caminhar. Apto a analisar situações no dia a dia da própria vida ou da vida alheia. Problematizando o que se chama de estilo de vida. Sabendo o valor de se respeitar às diferenças e às liberdades individuais. Olhando o céu à espera de discos-voadores e navegando nas redes. Sem se afastar dos valores sociais, culturais e humanos, aprendendo a ser cronista, não do tempo caduco, não como fuga no passado, cronista de seu tempo.

Comentários