MENINOS DANADOS

Djalma Carvalho

Há poucos dias, dei uma ligeira folheada em Meninos Danados, Levados...(Gráfica Editora, Maceió, 2009), primeiro e único livro publicado de autoria do meu falecido irmão José de Melo Carvalho. Nele encontrei o belíssimo prefácio escrito pelo conterrâneo Manoel Augusto Azevedo, escritor e economista, que, em primeiras palavras, disse: “Poucas vezes consegui ler um livro num só fôlego, numa só tarde, sem engolir palavras.” E mais: “As narrativas de Zé Carvalho fizeram-me reviver tempos de meninices, pontuados de estripulias. Éramos, afinal, felizes e não sabíamos.”
Quanto ao título do livro, mestre Aurélio me socorreu, dizendo que o vocábulo “danado” também significa, em brasileirismo familiar, “travessura, diabrura”.
De minha parte, acrescentaria como significado: molecagem, traquinagem, presepada, estripulia, arroubo juvenil, entusiasmo, românticas aventuras, etc. Zé Carvalho e sua turminha da mesma idade, ainda adolescentes, praticavam tudo isso aí sem causar prejuízo a ninguém, apenas travessuras engraçadas. Eram quase todos eles moradores da Rua Nova, Rua do Sebo e adjacências, principal “campo de ação” onde pintavam o sete. Tinham como amigos dali Zé Maximiano, Zé Urbano, soldado Leôncio, professor Conrado, e outros mais.
Ao final do livro, Zé Carvalho registrou os apelidos de cada um da turma e suas origens familiares. Vejamos, então: Demóstenes “demônio”, Lobão, Raposo, João Neto Capela, João Neto do Mato, Manoel Válter, Chico Manga Larga, Cara Veia, Lobinho, Pé de Chumbo, Tonho Jacaré, Colorau, Iran Peri e Zé Furão.
Hoje, dois ou três da turminha danada não mais pertencem ao mundo dos vivos, mas ficaram todos eles na história de Santana do Ipanema, por suas travessuras engraçadas, por suas diabruras.
O Tênis Clube Santanense, clube social da cidade, em seus grandes bailes festivos de outrora, exigia o uso de paletó e gravata dos frequentadores masculinos. Daí o tormento do grupo porque somente três ou quatro deles possuíam o traje exigido pelo clube. Aos demais cabia receber do lado de fora, arremessados por cima do muro, paletós e gravatas. Concluída positivamente a operação, estavam todos eles logo mais participando do baile, tranquilamente.
Lá para a década de 1980, por aí, época de grandes e históricos bailes, estava à direção do clube Josa Pinto, como seu presidente. À meia-noite se dava a parada da orquestra por conta de cláusula contratual. O presidente Josa, nesse providencial intervalo, costumava convidar, distintamente, um grupo de amigos para um recheado e apetitoso lanche servido no primeiro andar do clube. Ali, eram servidos pratos de peru, galinha guisada, à cabidela e do saboroso prato de cágado, quelônio preparado por Abílio Chagas. Lanche servido com copos de cerveja gelada, refrigerantes e uísque.
Os meninos danados já conheciam essa habitual cortesia do presidente do clube. Em certo baile, antes que acontecesse o intervalo dos músicos, os sabidos jovens anteciparam-se ao presidente Josa e subiram, sorrateiramente, os degraus até o lugar do polpudo lanche, onde comeram e beberam à vontade. Depois, desceram silenciosamente as escadas e misturaram-se ao público da festa, como se nada ali tivesse acontecido.
Também lá estava eu participando desse grande baile da festa da padroeira da cidade, como de costume. Soube, lá mesmo no clube, da ocorrência dessa travessura dos meninos danados.
Acho, afinal, que até hoje Josa Pinto, amigo de todos, não consegue identificar, um a um, os autores da molecagem que, àquela época, frustrou a cortesia que ele, como presidente, costumava dispensar a um grupo de privilegiados sócios do Tênis Clube Santanense.

Maceió, abril de 2025.

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