INSPETOR QUEBRA-GALHO

Djalma Carvalho

Aprovado em concurso, tomei posse em 20 de julho de 1961 na agência do Banco do Brasil em Santana do Ipanema. Em fins de 1962, apareceu por lá o inspetor Natanias Von Söhsten, delegado da Direção Geral, para inspecionar a agência. Dizia ter nome de origem germano-austríaca.
Já tratei deste assunto em crônica, escrita em setembro de 1996 e com outro título, publicada no meu livro Chuviscos de Prata (Edições Edufal, Maceió, 2000, pp.99/101), agora, refundida, revisada, alterada.
Desse inspetor recolhi a impressão primeira de um profissional extremamente competente e singular pessoa humana. Deixou na agência mensagem especial de otimismo, feita à sua maneira alegre de trabalhar. Diferentemente de outros – bigodudos e autoritários – que eu haveria de conhecer ao longo de minha carreira de bancário, de escriturário a gerente geral de agência.
Naquela época ainda se respirava o clima da política desenvolvimentista, de pleno emprego, implantada por Juscelino Kubitschek no quinquênio administrativo anterior. O BB, como executor da política governamental de valorização da agricultura, financiava o produtor rural, promovendo, nesse particular, riquezas por esse Brasil afora. Nas agências abarrotadas de agricultores o barulho das máquinas de escrever era ensurdecedor. Não se falava, então, em política neoliberal nem em privatização do Banco do Brasil.
Pois bem. Aí apareceu o Inspetor Natanias, aparentando bem idoso, já careca e viciado em fumar cachimbo. Remexeu a agência, fez recomendações, examinou títulos e documentos, e escreveu, com redação fluente e bastante expressiva, páginas e páginas do seu relatório sobre o que observara em sua missão. Incensou o ambiente de trabalho com baforadas do seu inseparável cachimbo.
Em determinado momento da sua estada na agência, chamou alguns recém-empossados e lhes perguntou se quebrariam seu galho. Susto danado de todos, porque ainda de pouco tempo de serviço no BB.
Imediatamente, puxou de sua pasta um pequeno ramo que colhera de roseira do quintal da agência, entregando-lhes, gargalhando.
Terminada a bem-sucedida missão, dirigiu-se ao Cadastro, onde eu trabalhava. Recomendou que reunisse os demais colegas do setor para que ouvissem o que ele iria ler. As chamadas impressões finais.
Ali, de pé, ouvimos: “Rapazes inteligentes, tratáveis, conduzem o setor com esmero e zelo e sem falhas. O Banco orgulha-se das qualidades e do desempenho de vocês. Parabéns.” E disse mais coisas elogiosas.
Surpresos e desconfiados, mas, no fundo, orgulhosos, ficamos olhando, interrogativos, um para o outro. Então, perguntamos-lhe: “Inspetor, nós somos tudo isso aí?”
Resposta dele, desmanchando-se em gargalhada: “Não, não. Isso é o que eu desejo que vocês o sejam!”
Soubemos, tempos depois e vagamente, que o inspetor Natanias, essa grande figura humana, havia sido aposentado e teria sido punido pelo golpe militar de 1964.
Maceió, junho de 2022.

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