A PEIDADA

Crônicas

Antonio Machado

O protestantismo instituído em 1517 na Alemanha, por Martinho Lutero, demorou para chegar ao município de Olho d’Água das Flores, somente em meados da década de 1940, foi trazido pelo cidadão Antônio José, um moreno alto, e muito conversador, residente nos arrabaldes do povoado Pedrão. Vindo de São Paulo, trouxe essa semente, que foi aos poucos, se espalhando, procurando atrair seguidores, gradativamente, foram se achegando Batista e família, Pedro Barbosa e família, exceto um filho, João, que só veio a ingressar nessa seita já em idade adulta, além de outros que não gostavam da igreja católica, mormente àqueles que não frequentavam a missa, por ojeriza aos padres.

Nos anos cinquenta apareceu um americano velho chamado de “reverendo” Neves, era um homem alto vermelho, um gringo, esse era o chefe dos ”crentes” na religião, e vez por outra, aparecia na casa do cidadão Pedro Barbosa, que aderiu de corpo e alma a nova “religião” como penhor de salvação, sendo a presença do “reverendo” motivo de festas e louvores ao Senhor. E numa dessas noitadas de cantos, cultos e louvores, a sala de casa estava cheia, todos sentados, cabisbaixos, estavam orando. O dono da casa, sentado numa lata de querosene de marca Jacaré, vazia, com um buraco em cima. O silêncio era sepulcral. Era comum na época, pessoas pedirem para se arrancharem em frente às casas, especialmente, onde haviam árvores, e naquela mesma noite estavam arranchados uns carreiros em frente a casa de Pedro, aboletados aos pés de uma velha cajarana no final do terreiro terreiro. Por arte da peste, os carreiros estavam assando carne, o cheiro atraiu um gato velho esfomeado da casa, que se aproximou do grupo, foi quando um deles deu uma curriada no gato, desavisado, o gato correu e pulou na janela da casa, e consequentemente, foi em cima do homem que estava à janela em oração, que sorrateiramente, soltava uma bufa “de leve” soprando, de mansinho, com o susto do gato nas costas, não segurou e soltou uma gostosa peidada dentro da lata que encarregou de aumentar a zuada do “pum”, a maioria dos presentes saiu às gargalhadas, enquanto os mais idosos suportaram o riso, foi um mico da gota serena.

Dias depois, Colly Flores, o poeta sem métrica, escreveu esta décima:” estavam em oração/ o gato vinha correndo,/ com as costas ardendo/ por causa da curriada/ vinha em disparada,/ e na janela pulou/ no velho se montou/ que estava concentrado/ numa lata sentado/ que não teve jeito, peidou”. Estes e outros fatos marcaram o passado de nossa gente tão simples quanto boa, e vez por outra, vou escrevendo esses fatos jocosos para à posteridade, e não se perderem nas dobras dos anos nem nas brumas das noites.

*Antonio Machado é escritor, historiador olhodaguense, membro da ACALA. E da ASSOCIAÇÃO ALAGOANA DE IMPRENSA.

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