Cremação, prudência e Caridade

Paiva Netto

A nossa responsabilidade com o envoltório físico que Deus nos ofereceu é
deveras séria. E isso se aplica a todas as etapas da existência, incluindo a morte e a
transição para o lado ainda invisível da Vida Eterna. Os instantes que se seguem
imediatamente após o desenlace também inspiram cuidados. Por isso, fui buscar no
primeiro volume das Sagradas Diretrizes Espirituais da Religião de Deus, do
Cristo e do Espírito Santo (1987) nosso ponto de vista contra a cremação dos
corpos. Há consequências terríveis para o Espírito que começará sua adaptação à
nova esfera, como vocês poderão ler:
Sem a Alma, o corpo é o cadáver. Porém, essa minha afirmativa não
significa dizer que os despojos, pelo menos nos primeiros tempos da morte, não
sejam instrumentos de condução de sensibilidades ao Ser Espiritual, por meio do
perispírito. Para facilitar o entendimento desse ensino, vamos dar a palavra ao
Espírito Emmanuel, quando nos fala sobre o delicado tema da cremação de corpos
defuntos. Ele responde à pergunta 151, constante do seu livro O Consolador, pela
psicografia do médium brasileiro Chico Xavier (1910-2002), Legionário da Boa
Vontade nº 15.353:
151 — O espírito desencarnado pode sofrer com a cremação dos elementos
cadavéricos?
— Na cremação, faz-se mister exercer a piedade com os cadáveres,
procrastinando por mais horas o ato de destruição das vísceras materiais, pois, de
certo modo, existem sempre muitos ecos de sensibilidade entre o Espírito
desencarnado e o corpo onde se extinguiu o “tônus vital”, nas primeiras horas
sequentes ao desenlace, em vista dos fluidos orgânicos que ainda solicitam a alma
para as sensações da existência material.
Em 28 de julho de 1971, durante sua famosa entrevista para o programa
Pinga-Fogo, da antiga TV Tupi, em São Paulo/SP, Chico Xavier, ao responder a
questionamento de uma telespectadora, lido pelo jornalista Almyr Guimarães
(1924-1991), ressaltou o que Emmanuel aconselha:
— O tempo de expectativa deve ser nada menos que 72 horas, numa câmara
fria, para o nosso veículo carnal, quando nos desvencilhamos dele, no caso de
optarmos pela cremação.
Apresento também, para a análise de vocês, algumas considerações dos
nobres amigos do Mundo da Verdade Flexa Dourada (Espírito) e dr. Bezerra de
Menezes (Espírito). Trata-se de comunicações mediúnicas por intermédio do
sensitivo Cristão do Novo Mandamento Chico Periotto. São ressalvas que
merecem dedicada atenção.
Diz Flexa Dourada:
— Sobre a instrução de Emmanuel de que só se deveria cremar corpos depois
de 72 horas — e olhe lá —, isso seria boa condição para um Espírito
completamente [em vida] desapegado da carne. O melhor é enterrar o corpo da
pessoa que desencarnou. Vai para debaixo da terra aquilo que vem da terra. Isso é
uma lei da Natureza.
E reforça o dr. Bezerra:

— Espalhem sempre que a cremação não é vista com bons olhos no Mundo
Espiritual. Mesmo quando o Espírito já deixou totalmente o vaso físico, as
lembranças ficam registradas na memória espiritual. Deixemos a Terra consumir
aquilo que ela trouxe sem agressões. Tudo que radicalize, tudo que afronte a
vestidura humana, interfere no equilíbrio espiritual. Tratemos bem de nosso vaso
corpóreo. Façamos dele a morada de Deus. (...) Imaginem o acidente de um
caminhão em alta velocidade, batendo contra uma muralha. A cremação é
algumas vezes pior que isso.
Apresentamos ainda nessa análise a visão do Judaísmo acerca do
desligamento entre corpo e Alma. Com a palavra, o rabino Ilan Stiefelmann:
— A Lei judaica é inequívoca e intransigente em sua insistência para que o
corpo, na sua totalidade, seja devolvido à terra. Com a morte, a alma passa por
uma dolorosa separação do corpo que até então lhe servira de abrigo. Esse
processo de separação é concomitante à decomposição do corpo. A partir do
momento em que o corpo é enterrado, ele se desintegra paulatinamente,
fornecendo desta forma um conforto à alma que está se liberando do corpo. (...) O
processo gradual do retorno ao solo através do sepultamento é natural e carrega
um importante simbolismo: o falecimento de uma geração permite o brotamento
de outra, e os vivos são nutridos e inspi­rados pelo legado daqueles que já se
foram. Nossos antepassados são o solo do qual nós brotamos. Mesmo em sua
morte, eles são uma fonte de vida!
A fim de contribuir para o debate do tema, recorremos igualmente ao
pensamento do Islamismo. O respeitado professor de Estudos Islâmicos, da
Universidade de Georgetown (EUA), John L. Esposito elucida:
— A cremação é proibida no Islã, porque é considerada desrespeito ao
falecido. Alguns estudiosos da religião que acreditam que a cremação é contrária
aos ensinamentos do Islã e é uma violação da lei islâmica citam o Alcorão 80, 21:
“Depois [Allah] o fez morrer e o sepultou”, e um hadith no qual o Profeta teria
dito: “O modo de honrar o falecido é enterrá-lo”. Assim, é considerado uma
obrigação dos muçulmanos, como uma comunidade, garantir que todo muçulmano
que morra seja adequadamente limpo, envolvido numa mortalha e enterrado de
acordo com os ensinamentos do Islã.

Para evitar padecimentos cruéis

Minhas Irmãs e meus Irmãos, o dever de Caridade nos impele a trazer para a
reflexão esses alertamentos.
Alguém pode naturalmente argumentar que não acredita em nada disso. E a
Fraternidade Ecumênica, que deve ser a bandeira do diálogo, nos leva a respeitar a
crença de cada um. Mas, e se estivermos abordando aqui uma realidade? Há tanto
ainda por se conhecer melhor! A cada dia, a própria Ciência descobre fatos novos
ou corrige teorias antes inegociáveis, superando antigas controvérsias...
Em nome do Amor que devotamos aos nossos entes queridos, não custa nada
repensarmos um pouco sobre o assunto e, assim, evitar padecimentos cruéis a eles
depois que fizeram sua passagem para a Outra Vida.

José de Paiva Netto, jornalista, radialista e escritor.
paivanetto@lbv.org.br — www.boavontade.com

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