DE BRAÇOS COM A POESIA

Antonio Machado

Fugindo talvez, á regra das minhas costumeiras crônicas semanais, e em sendo admirador da poesia, aventurei-me a escrever estás mal traçadas linhas, como se dizia nos “patrazmente” da história, em breve “palavrório” sobre a arte de ser poeta. Não sou poeta, mas admirador daqueles que praticam a poesia trazendo no seu cerne a beleza poética, encontrando a poesia nas palavras, e justamente, é nos vocábulos que se encontra o néctar da poesia, da beleza que encanta o poeta, escreveu o poeta: “poeta é quem ver poesia nas flores/e olha a vida por um caleidoscópio de cores/poeta é quem tem imaginação/e sabe que os olhos da alma/são as janelas do coração”.
O que é mais difícil, ser poeta ou escritor? Dentro de minha ínfima capacidade de entender, acho que ser poeta é mais difícil, embora, hoje, muitos os são, todavia sem as regras corretas que a poesia requer, o poeta nasce, e o escritor se faz.
Questiono-me, será que todo o escritor é poeta? Talvez sim, talvez não, porém todo poeta pode ser escritor, mas nem todo escritor pode ser poeta.
Houve na minha cidade, abucólica Olho d’Àgua das Flores, um concurso de poesia a nível do curso médio. Cerca de trinta estudantes participaram do certame, o tema era livre. Por ironia do destino, participei como jurado, com malgrados conhecimentos mesmo sem ser poeta, e mais, os demais jurados, nenhum entendia sequer, da pedra angular da poesia, que é a metrificação. Apresentados os trabalhos poéticos literários, somente dois participantes metrificaram as estrofes de quatro versos, avaliei somente a metrificação, deixando a versificação, concordância verbal e outros atributos gramaticais inerentes a poesia, ambos vencedores descendem de poeta.
A poesia me fascina, estou concluindo uma antologia dos poetas olhodaguenses mesmo sabendo que para os dias atuais, o trabalho não desperta o interesse em ninguém, mas na calenda do tempo, poderá ter a recompensa que o presente lhe nega, porque se não registrarmos hoje o presente, amanhã ninguém conhecerá nosso passado.
Veja caro leitor, abaixo, uma pérola de poesia intitulada CONTA E TEMPO, cujo autor me é desconhecido do magnifico soneto escrito com a tinta da inteligência e pena do coração, a poesia está em toda parte, porém, carece do poeta para descobri-la, pois o escritor ver, mais não enxerga, enquanto arguta inteligência do poeta ver os dois ângulos.

CONTA E TEMPO
Deus pede estritamente conta do meu tempo
E eu vou, do meu tempo, dar-lhe conta;
Mas, como dar, sem tempo, tanta conta,
Eu que gastei, sem conta tanto tempo?

Para dar minha conta feita a tempo,
O tempo me foi dado e não fiz conta;
Não quis, sobrando tempo, fazer conta,
Hoje quero acertar conta não há tempo.

Ô voz que tendes tempo sem ter conta,
Não gastei vosso tempo em passa tempo;
Cuidai, enquanto é tempo, em vossa conta.

Pois aqueles que, sem conta, gastam tempo,
Quando o tempo chegar de prestar conta,
Choraram, como eu, o não ter tempo.

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